Mestre da paciência

Indicação: Estimular a calma e paciência em situações difíceis.
Conta a lenda que um velho sábio, tido como mestre da paciência, era capaz de derrotar qualquer adversário.
Certa tarde, um homem conhecido por sua total falta de escrúpulos apareceu com a intenção de desafiar o mestre da paciência. O velho aceitou o desafio e o homem começou a insultá-lo. Chegou a jogar algumas pedras em sua direção, cuspiu em sua direção e gritou todos os tipos de insultos.
Durante horas fez tudo para provocá-lo, mas o velho permaneceu impassível.
No final da tarde, sentindo-se já exausto e humilhado, o homem se deu por vencido e retirou-se. Impressionados, os alunos perguntaram ao mestre como ele pudera suportar tanta indignidade.
O mestre perguntou:
– Se alguém chega até você com um presente, e você não o aceitar, a quem pertence o presente?
– A quem tentou entregá-lo. Respondeu um dos discípulos.
– O mesmo vale para a inveja, a raiva e os insultos. Quando não aceitos, continuam pertencendo a quem os carregava consigo.
Autor desconhecido

O Pote Rachado

Indicação: Estimular a percepção de que os defeito podem ser úteis quando bem trabalhados.
Um carregador de água na Índia levava dois potes grandes, ambos pendurados em cada ponta de uma vara a qual ele carregava atravessada em seu pescoço.
Um dos potes tinha uma rachadura, enquanto o outro era perfeito e sempre chegava cheio de água no fim da longa jornada entre o poço e a casa do chefe.
O pote rachado chegava apenas pela metade.
Foi assim por dois anos, diariamente, o carregador entregando um pote e meio de água na casa de seu chefe.
Claro, o pote perfeito estava orgulhoso de suas realizações.
Porém, o pote rachado estava envergonhado de sua imperfeição, e sentindo-se miserável por ser capaz de realizar apenas a metade do que havia sido designado a fazer.
Após perceber que por dois anos havia sido uma falha amarga, o pote falou para o homem um dia, à beira do poço:
– Estou envergonhado, quero pedir-lhe desculpas.
– Por quê?, perguntou o homem. – De que você está envergonhado?
– Nesses dois anos eu fui capaz de entregar apenas metade da minha carga, porque essa rachadura no meu lado faz com que a água vaze por todo o caminho da casa de seu senhor. Por causa do meu defeito, você tem que fazer todo esse trabalho, e não ganha o salário completo dos seus esforços, disse o pote.
O homem ficou triste pela situação do velho pote, e com compaixão falou:
– Quando retornarmos para a casa do meu senhor, quero que percebas as flores ao longo do caminho.
De fato, à medida que eles subiam a montanha, o velho pote rachado notou flores selvagens ao lado do caminho, e isto lhe deu ânimo.
Mas ao fim da estrada, o pote ainda se sentia mal porque tinha vazado a metade, e de novo pediu desculpas ao homem por sua falha.
Disse o homem ao pote:
– Você notou que pelo caminho só havia flores no seu lado do caminho??? Notou ainda que a cada dia enquanto voltávamos do poço, você as regava??? Por dois anos eu pude colher flores para ornamentar a mesa do meu senhor. Sem você ser do jeito que você é, ele não poderia ter essa beleza para dar graça à sua casa.
Cada um de nós temos nossos próprios e únicos defeitos.
Todos nós somos potes rachados.
Porém, se permitirmos, o Senhor vai usar nossos defeitos para embelezar a mesa de Seu Pai.
Na grandiosa economia de Deus, nada se perde.
Nunca deveríamos ter medo dos nossos defeitos.
Basta reconhecermos nossos defeitos e eles com certeza embelezarão a mesa de alguém.
Das nossas fraquezas, devemos tirar nossa maior força…

Lago congelado

Indicação: Estimular pessoas com pensamentos negativos, auto-limitantes.
Conta a lenda que estavam duas crianças patinando despreocupadamente em cima de um lago congelado. De repente, o gelo se quebrou e uma das crianças caiu na água.
A outra criança vendo que seu amiguinho se afogava debaixo do gelo, pegou uma pedra e começou a golpear com todas as suas forças, conseguindo quebrá-lo e salvar seu amigo.
Quando os bombeiros chegaram e viram o que havia acontecido, perguntaram ao menino:
Como você fez? É impossível que você tenha quebrado o gelo com essa pedra e suas mãos tão pequenas!
Nesse instante apareceu um ancião e disse:
– Eu sei como ele conseguiu.
Todos perguntaram:
Como?
O ancião respondeu:
– É que não tinha ninguém ao seu redor para lhe dizer que não poderia ser feito!!!
“Se você consegue imaginar, pode conseguir.”
Autor: Albert Einstein

A Lagosta

Não somos diferentes de um crustáceo particularmente duro. A lagosta cresce formando e largando uma série de cascas duras, protetoras. Cada vez que ela se expande, de dentro para fora, a casca confinante tem de ser mudada. A lagosta fica exposta e vulnerável até que, com o tempo, um novo revestimento vem substituir o antigo.
A cada passagem de um estágio de crescimento humano para outro, também temos de mudar uma estrutura de proteção. Ficamos expostos e vulneráveis, mas também efervescentes e embriônicos novamente, capazes de nos estendermos de modo antes ignorado.
Essas mudanças de pele podem durar vários anos; entretanto, se sairmos, de cada uma dessas passagens, entramos num período prolongado e mais estável, no qual podemos esperar relativa tranquilidade e uma sensação e reconquista de equilíbrio.
Citado em “Passagens”, de Gail Sheehy
Contribuição: Cecília Caram

O homem que teve que cuidar da casa

Indicação: Questionando o papel masculino
Era uma vez um homem muito rabugento e mal-humorado, que nunca achava certo nada que a mulher fizesse em casa. Uma tarde, na época de secar o feno, ele chegou em casa reclamando que o jantar não estava pronto, o bebê estava chorando e a vaca não tinha sido recolhida ao estábulo.
-“Eu trabalho o dia inteiro”, ele resmungou. “Você fica só cuidando da casa. Bem que eu queria essa moleza para mim. Eu ia aprontar o jantar na hora , palavra.”
-“Amorzinho querido, não fique zangado”, disse a mulher. “Amanhã vamos trocar nossos trabalhos. Eu saio com os ceifeiros, corto feno, e você fica aqui, cuidando da casa.”
O marido achou que daria certíssimo.
– “É, eu ganho um dia livre”, ele disse, “faço todos os seus afazeres em uma hora ou duas e durmo o resto da tarde inteira.”
Assim, na manhã seguinte, bem cedo, a mulher pendurou a foice no ombro e partiu com os ceifeiros. O marido ficou incumbido de fazer todo o trabalho doméstico.
Em primeiro lugar, lavou umas roupas e começou a bater a manteiga. Mas depois de bater um pouquinho, lembrou que tinha que pendurar as roupas para secar. Saiu para o quintal e mal tinha acabado de estender suas camisas quando viu o porco correndo para dentro da cozinha.
Voou para a cozinha para tratar do porco, temendo que estragasse a manteiga. Mas logo que entrou, viu o porco derrubando a batedeira. Lá estava ele, grunhindo e chafurdando o creme, que escorria pelo chão da cozinha inteira. O homem ficou tão louco da vida que esqueceu das camisas no varal e partiu para cima do porco.
Conseguiu agarra-lo, mas o porco estava tão lambuzado de manteiga, que lhe escapuliu dos braços e saiu porta afora. O homem correu para o quintal, decidido a pegar o porco de qualquer jeito, mas estacou apavorado quando viu o bode, parado bem debaixo do varal e mascando as camisas. Então o homem espantou o bode, trancou o porco e tirou do varal o que sobrara das camisas.
Em seguida foi à leiteira, pegou creme bastante para encher de novo a batedeira e recomeçou a bater, pois tinham que ter manteiga para o jantar.
Quando já tinha batido um pouco, lembrou que a vaca ainda estava fechada no estábulo sem ter comido nem bebido nada a manhã toda; e o sol já estava alto.
Matutando que o pasto ficava muito longe para levar a vaca até lá. Decidiu coloca-la em cima da casa, pois o telhado, como se sabe, era coberto de capim. A casa ficava perto de um morro íngreme e ele achou que, estendendo uma tábua larga da lateral do morro até o telhado, levaria facilmente a vaca para cima.
Mas não podia abandonar a batedeira, pois lá vinha o bebê engatinhando pela casa.
– “Se eu deixar a batedeira”, ele pensou, “a criança com certeza vai estragar tudo”.
Assim, ajeitou a batedeira às costas e saiu carregando-a. Ai, pensou que era melhor dar água à vaca antes de leva-la para o telhado e pegou o balde para tirar água do poço. Porém, quando se debruçou na borda do poço, o creme escorreu para fora da batedeira, por cima dos ombros, pelas costas e caiu todo no poço.
Agora já estava quase na hora do jantar e ele nem ao menos tinha feito a manteiga! Então, logo que colocou a vaca no telhado, achou melhor ferver o mingau. Encheu o caldeirão de água e pendurou-o sobre o fogo.
Quando acabou, imaginou que a vaca pudesse cair do telhado e quebrar o pescoço. Então subiu na casa para prende-la. Amarrou uma ponta da corda no pescoço da vaca e a outra ele passou pelo buraco da chaminé. Voltou para dentro da casa e amarrou a ponta da corda na cintura. Tinha que se apressar, pois a água começava a ferver no caldeirão e ele tinha que moer a aveia.
Começou a moer bem rápido! Mas quando estava bem empenhado, a vaca acabou caindo do telhado e na queda arrastou o homem pela chaminé, suspenso pela corda! Ele ficou entalado, bem apertado. E a vaca ficou balançando ao lado da casa, entre o céu e a terra, sem conseguir nem subir nem descer.
Enquanto isso a mulher lá no campo, estava esperando o marido chama-la para jantar. Por fim, achou que já tinha esperado demais e foi para casa.
Quando chegou e viu a vaca pendurada tão insolitamente, correu para cima e cortou a corda com a foice. Mas logo que cortou, o marido despencou da chaminé!
– “Que bom que você voltou”, disse, depois que ela o pescou. “Preciso lhe dizer uma coisa.”
Então ele pediu desculpas, beijou-a e nunca mais reclamou de nada.
Lenda escandinava contada em “O livro das Virtudes” Uma antologia de William J. Bennett.
Contribuição: Cecília Caram

Não vá pelas aparências

Indicação: Como criar vínculos
Num reino antigo havia um príncipe, filho único do rei, que de repente enlouqueceu. Ele arrancou suas roupas, ficou nu, entrou debaixo da mesa e começou a cocoricar como um galo. Ele pensava que era um galo.
O rei ficou desesperado, chamou todos os médicos, mágicos e fazedores de milagre para tentarem curar o príncipe, mas de nada adiantou. O rei começou a aceitar o fato de que seu filho tinha ficado louco para o resto da vida.
Um dia, entretanto, um sábio chegou ao palácio e disse que podia curar o príncipe. O rei ficou muito desconfiado porque o homem parecia também um maluco, mais maluco ainda do que o príncipe. O sábio disse:
– “Somente eu posso curar seu filho, porque só um louco maior pode curar outro louco. Os seus médicos, mágicos e fazedores de milagres falharam porque eles não conheciam a loucura”.
O rei achou o argumento lógico e como o caso parecia sem jeito, resolveu experimentar.
Assim que o sábio tirou suas roupas, entrou debaixo da mesa com o príncipe e começou a cocoricar como um galo, o príncipe tomou posição de defesa:
– “Quem é você? O que pensa que está fazendo”?
O homem disse:
– “Eu sou um galo, um galo mais experiente do que você. Você é apenas um aprendiz de galo”.
O príncipe aceitou:
– “Se você também é um galo, está bem. Mas você parece um ser humano”.
– “Não vá pelas aparências”, respondeu o sábio, “veja meu espírito, a minha alma. Eu sou um galo tanto quanto você”.
Os dois ficaram amigos. Prometeram longa amizade e juraram que lutariam juntos contra o mundo.
Passaram-se uns dias. O sábio começou a se vestir.
O príncipe replicou:
– “O que você está fazendo? Você ficou maluco? Um galo usando roupa de gente”!
O homem respondeu:
– “Estou apenas procurando enganar aqueles tolos seres humanos. Lembre-se de que, mesmo vestido, nada mudou em mim. Sou um galináceo e ninguém pode mudar isso. Só porque estou vestido, você acha que me tornei um ser humano”?
O príncipe aceitou a explicação. Dias mais tarde o sábio persuadiu-o de que se vestisse, porque o inverno estava chegando.
Um dia, de repente, o sábio pediu comida do palácio. O jovem ficou atento e desconfiado gritando:
– “Que é que você está fazendo? Você vai come como um ser humano qualquer. Nós somos galos e comemos como galos”.
O homem respondeu calmamente:
– “Você pode comer qualquer coisa e aproveitar qualquer coisa. No que se refere ao meu galo, não faz a menor diferença. Você pode viver como um ser humano e continuar sendo um galináceo. Não vá pelas aparências”.
Dessa maneira, o sábio, aos poucos, foi persuadindo o príncipe a voltar ao mundo da realidade, até que foi considerado normal.
Recolhido por Zélia Nascimento
Contribuição: Cecília Caram

A Estrela

Indicação: Missão existencial
Era uma vez um escritor, um homem muito sábio. Todos os dias ele caminhava pela praia, a busca de quietude e inspiração.
Um dia, de longe, avistou um vulto que parecia dançar. Curiosos, apertou o passo para chegar mais perto. Percebeu que ali se encontrava um jovem, que abaixava, pegava algo na areia e fazia um movimento com as mãos em direção ao mar. O homem esboçou um sorriso, se aproximou e perguntou:
– “ O que está fazendo, meu jovem?”
– “Jogando estrelas na água do oceano… o sol está a pino, e se não fizer isso, elas morrerão.”
– “Isso não faz diferença… á milhões de estrelas, milhões de praias”… E continuou sua dança, acrescentando:
-“Faz diferença PARA ESSAS AI”…
O poeta ficou confuso. A visão do jovem lhe perseguia. Tentou ignorar as imagens… Estrelas na areia… Mar… Estrelas de volta ao mar.. a dança do jovem, numa cadência suave e persistente… Quanto mais tentava ignorá-las, mais elas persistiam…
Até que o poeta percebeu que aquele rapaz fazia a opção por AGIR no universo e construir com ALGUMA diferença, envergonhado e inquieto pelo contraste de se colocar no mundo somente como OBSERVADOR. A noite veio, e o poeta, inspirado pelas estrelas do céu, rascunhou algumas linhas sobre sua recente experiência.
Ao raiar do dia, se dirigiu à praia, coração batendo forte, ansioso por se juntar ao jovem… Quando o encontrou, apenas se colocou a seu lado, e iniciou silenciosamente a sua dança.
Autor: Ailer
Reescrita e Contribuição: Cecília Caram.

Sapo Escaldado

Indicação: Pessoas Resistentes a Mudanças
“Se você colocar um sapo em uma panela de água fervendo, ele tentará pular para fora da panela imediatamente. Mas, se colocar o sapo em uma panela com água e temperatura ambiente, sem assustá-lo, ele ficará dentro da panela. Agora, se colocar a panela no fogo e aumentar gradativamente a temperatura, acontecerá uma coisa bastante interessante. Quando a temperatura aumentar de 20 para 30 graus, o sapo não se mexerá. Na verdade, dará sinais de que esta gostando.
Porém, à medida que a temperatura for aumentando gradativamente, o sapo ficará cada vez mais tonto, até que não será mais capaz de sair da panela. Embora nada o impeça de pular, ele continuará na panela, até ser escaldado. Por quê?
Porque, nos sapos, o mecanismo interno que detecta as ameaças à sobrevivência é regulado para identificar mudanças súbitas do meio ambiente, e não mudanças lentas e graduais.”
Peter Senge – A Quinta Disciplina.

O Fogo e a Água

Indicação: Pessoas Autoritárias
No século IV A.C., escondido nos limites da província de Lu, estendia-se o distrito governado pelo duque Chuang. Embora pequeno, o distrito havia prosperado bastante na gestão anterior à do duque. Mas, desde que Chuang assumiu o governo, os negócios tinham-se deteriorado. Confuso, o duque se dirigiu à montanha de Han para receber um pouco da sabedoria do grande mestre Mu-sun.
Ao chegar à montanha, encontrou o mestre sentado calmamente sobre uma pequena pedra, a contemplar o vale. Depois de lhe explicar a situação, Chuang esperou, com ansiedade, que o mestre falasse. Mu-sun, porém não disse uma só palavra. Deu apenas um pequeno sorriso e com um gesto convidou o duque a acompanha-lo.
Silenciosamente, eles caminharam até que o Rio Tan Fu lhes molhasse os pés. A outra margem não podia ser vista, tão largo ele era. Depois de meditar olhando as águas, Mu-sun preparou uma fogueira. Quando as labaredas já subiam altas, o mestre fez com que Chuang se sentasse a seu lado. Ficaram ali sentados por longas horas, enquanto o fogo queimava brilhante. A noite veio e se foi. Quando a aurora chegou, as chamas já não dançavam mais. Mu-sun apontou então para o rio e, pela primeira vez desde que o duque chegara, falou: “Agora você entende porque é incapaz de fazer como seu predecessor fez para sustentar a grandeza de seu distrito.?”
Chuang olhou-o perplexo. Ele sabia agora tão pouco quanto antes. Sentiu-se envergonhado. “Grande mestre”, ele disse, “ desculpe minha ignorância, mas não consigo alcançar sua sabedoria”. Mu-sun, então, falou pela segunda vez: “Reflita, Chuang, sobre a natureza do fogo que queimava à nossa frente. Era forte e poderoso. Suas chamas subiam, dançavam e choravam como se vangloriassem de algo. Nenhuma grande árvore ou animal poderia igualar-se em força. Com facilidade, poderia ter conquistado tudo ao seu redor”.
“Em contraste, Chuang, considere o rio. Começou como um pequeno fio nas montanhas distantes. Às vezes rola macio, às vezes rápido, mas sempre navega para baixo, tomando as terras baixas como seu curso. Contorna qualquer obstáculo e abraça qualquer fenda, tão humilde é sua natureza. A água dificilmente pode ser ouvida. Quando a tocamos, percebemos que ela dificilmente pode ser sentida, tão gentil é sua natureza”.
“ E no final o que sobrou daquilo que foi o fogo poderoso? Somente um punhado de cinzas, por ser tão forte, Chuang, ele destrói tudo à sua volta, mas também se torna vitima. Ele se consome com sua própria força. O rio, não. Ele é calmo e quieto. Assim, ele vai rolando, crescendo, ramificando-se, tornando-se mais poderoso a cada dia em sua jornada em direção ao imenso oceano. Ele provê a vida e sustenta a todos”.
Depois de um momento de silêncio, Mu-sun voltou-se para o duque. “Da mesma maneira como na natureza, isso ocorre com os administradores. Há aqueles que são como fogo, poderosos e autoritários. Há também os que são
humildes como a água, donos de uma força interior de grande alcance e capazes de capturar o coração das pessoas. Aqueles não constroem. Estes trazem uma primavera de prosperidade para suas províncias.” E continuou o mestre: “Reflita, Chuang, sobre o tipo de administrador que você é. Talvez a resposta para seus problemas esteja ai”. Como um feixe de luz, a verdade se acendeu no coração do duque. Chuang ergueu os olhos. Tendo deixado seu orgulho de lado, ele agora só via o nascer do sol, do outro lado do rio.

O Caso do Espelho

Revista Nova escola – Abril/99 Indicação: Cada um vê o que quer
Era um homem que não sabia quase nada. Morava longe, numa casinha de sapé esquecida nos cafundós da mata.
Um dia, precisando ir à cidade, passou em frente a uma loja e viu um espelho pendurando do lado de fora. O homem abriu a boca. Apertou os olhos. Depois gritou, com o espelho nas mãos:
– Mas o que é que o retrato de meu pai está fazendo aqui?
– Isso é um espelho – Explicou o dono da loja.
– Não sei se é espelho ou se não é, só sei que é o retrato do meu pai.
Os olhos do homem ficaram molhados.
– O senhor… conheceu meu pai? – perguntou ele ao comerciante.
O dono da loja sorriu. Explicou de novo. Aquilo era só um espelho comum, desses de vidro e moldura de madeira.
– É não! – respondeu o outro. – Isso é o retrato de meu pai. É ele sim! Olha o rosto dele. Olha a testa. E o cabelo? E o nariz? E aquele sorriso meio sem jeito?
O homem quis saber o preço. O comerciante sacudiu os ombros e vendeu o espelho, baratinho.
Naquele dia, o homem que não sabia quase nada entrou em casa todo contente.
Guardou, cuidadoso, o espelho embrulhado na gaveta da penteadeira. A mulher ficou só olhando.
No outro dia, esperou o marido sair para trabalhar e correu para o quarto. Abrindo a gaveta da penteadeira, desembrulhou o espelho, olhou e deu um passo atrás.
Fez o sinal da cruz tapando a boca com as mãos. Em seguida, guardou o espelho na gaveta e saiu chorando.
– Ah, meu Deus! – gritava desnorteada. – É o retrato de outra mulher! Meu marido não gosta mais de mim! A outra é linda demais! Que olhos bonitos! Que cabeleira solta! Que pele macia! A diaba é mil vezes mais bonita e mais moça do que eu!
Quando o homem voltou, no fim do dia, achou a casa toda desarrumada. A mulher, chorando sentada no chão, não tinha feito nem a comida.
– Que foi isso mulher?
– Ah, seu traidor de uma figa! Quem é aquela jararaca lá no retrato?
– Que retrato? – perguntou o marido, surpreso.
– Aquele mesmo que você escondeu na gaveta da penteadeira!
O homem não estava entendendo nada.
-Mas aquilo é o retrato do meu pai!
Indignada a mulher colocou as mãos no peito:
– Cachorro sem-vergonha, miserável! Pensa que eu não sei a diferença entre um velho lazarento e uma jabiraca safada e honrosa?
A discussão fervia feito água na chaleira.
– Velho lazarento coisa nenhuma! – gritou o homem, ofendido.
A mae da moça morava perto, escutou a gritaria e veio ver o que estava acontecendo. Encontrou a filha chorando feito criança que se perdeu e não consegue mais voltar pra casa.
– Que é isso menina?
– Aquele cafajeste arranjou outra!
– Ela ficou maluca – berrou o homem, de cara amarrada.
– Ontem eu vi ele escondendo um pacote na gaveta lá no quarto, mãe! Hoje depois que ele saiu, fui ver o que era. Tá lá! É o retrato de outra mulher!
– A boa senhora resolveu, ela mesma, verificar o tal retrato. Entrando no quarto, abriu a gaveta, desembrulhou o pacote e espiou. Arregalou os olhos. Olhou de novo. Soltou uma sonora gargalhada.
– Só se for o retrato da bisavó dele! A tal fulana é a coisa mais enrugada, feia, velha, cacarenta, murcha, arruinada, desengonçada, capenga, careca, caduca, torta e desdentada que eu já vi até hoje!
– E completou, feliz, abraçando a filha:
– Fica tranquila. A bruaca do retrato já está com os dois pés na cova!